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quarta-feira, 27 de novembro de 2024

Artigo: Copa, estádios e terremoto

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Copa, estádios e terremoto

Por Paulo Renato Coelho Netto

Em junho completam seis meses que um vendaval destruiu um dos tuiuiús ornamentais em frente ao Aeroporto Internacional de Campo Grande, capital de Mato Grosso do Sul. Foi no início de dezembro de 2010. Agora em 2011, no dia 11 de março, o mundo inteiro assistiu aterrorizado as imagens de um tsunami e um terremoto de 8,9 graus na escala Richter que arrasou parte do Japão.

Seis dias após a tragédia os japoneses surpreenderam e reconstruíram uma estrada que liga a capital japonesa, Tóquio, à Naka, na província de Ibaraki. Com a mesma rapidez que a natureza abriu uma cratera na estrada eles foram lá e fecharam, pintaram e sinalizaram. Em apenas seis dias.

Outra imagem que abalou o planeta foi da onda gigante tomando completamente o aeroporto da cidade de Sendai, no nordeste do Japão. Um mês depois o terminal reabriu parcialmente suas pistas para vôos nacionais. Aqui nosso tuiuiú poderá fazer aniversário de meio ano de tombamento.

No Brasil funciona mais ou menos assim: primeiro é feito uma perícia técnica, com fotografias, para constatar que houve de fato um dano causado por uma força da natureza. O resultado é enviado para Brasília onde uma comissão analisa o caso. E o tuiuiú está lá, caído.

Devidamente constatado que houve o dano é aberta uma licitação para levantar os custos. Esta, por sua vez, segue para o chefe do setor, que analisa, dá o aval e retorna para a comissão licitatória aprovando a obra em caráter de urgência. Mas o tuiuiú ainda está combalido.

Aprovada a burocracia vem o mais complicado: a verba. Alguém, em algum lugar, em alguma sala, diz que não há no momento dotação orçamentária prevista para tirar o tuiuiú da UTI e reerguê-lo de novo para o deleite dos turistas que desembarcam na capital de Mato Grosso do Sul no Terminal Antônio João.

O tenente Antônio João, para quem ainda não sabe, é “o covarde brasileiro que matou, com mais meia dúzia de soldados, uma legião inteira de paraguaios na Guerra da Tríplice Aliança”, como afirmam nossos irmãos merceditos até hoje. Tem um parque temático com a história dele bem ali, ao lado de Ponta Porã, na cidade que leva seu nome também, Antônio João.

Enfim, não vamos perder o foco.

E o tuiuiú está lá, esfacelado. Cento e oitenta dias ainda não foram suficientes para que a população da capital de Mato Grosso do Sul pudesse reaver um dos seus símbolos turísticos e cultuais mais emblemáticos da cidade. A ave também representa o pantanal, esse rincão de água e terra que ainda vai se transformar em um grande canavial um dia.

A pergunta é: se nós não temos capacidade para recuperar um tuiuiú como uma estrada e um aeroporto na velocidade e seriedade do primeiro mundo japonês, quanto tempo vai levar para que uma das promessas de campanha do governador André Puccinelli se realize, que é a ampliação do aeroporto e a construção de um Terminal de Carga Internacional naquele complexo?

Há pelo menos vinte anos o aeroporto de Campo Grande está defasado. As acomodações incomodam, o local está apertado e em tempos de alta temporada o saguão ganha ares de feira livre a céu aberto.

O tuiuiú está lá [ou não está] para quem quiser ver. Deve começar a ser reconstruído esta semana pelo artista plástico Cleir, que o criou.

A Copa do Mundo vem aí e os aeroportos das cidades-sede do campeonato são apenas parte dos imensos gargalos de infra-estrutura para o evento. Não tem hotéis, faltam leitos, trens, metrôs, segurança, hospitais e até estádios. Resumindo: falta até o gramado. Mais um pouco alguém vai notar que não tem o apito do juiz e as bandeirinhas dos auxiliares.

O Rio de Janeiro está chafurdando na dengue. Como é possível levar os melhores times de futebol dos países para se expor na Cidade Maravilhosa e ter um jogador morto por um mosquito? Em Campo Grande não vai ter Copa no Morenão, mas garantimos desde já que teremos dengue em 2014.

Há quem diga que o Brasil só não cai no buraco porque é maior que o buraco. Há controvérsias.

Na década de 80, ainda na ditadura militar, Roger Moreira, do Ultraje a Rigor, compôs a música “Inútil”, que trazia um refrão assim: “A gente faz carro e não sabe guiar. A gente faz trilho e não tem trem prá botar. A gente faz filho e não consegue criar. A gente pede grana e não consegue pagar… Inúteu! A gente somos inúteu!”

Basicamente é isso. No mais, todos estão convidados para a missa de meio ano de falecimento do tuiuiú do aeroporto de Campo Grande. O culto, no entanto, pode não ocorrer por falta de vela e até fósforo para acendê-la.

Paulo Renato Coelho Netto é jornalista, pós-graduado em marketing

[email protected]

Foto: Valdenir Rezende / Correio do Estado On Line

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