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quarta-feira, 27 de novembro de 2024

Injustiça brasileira: desabafo de uma mãe

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Por Ana Maria Chamorro

Uma certa vez vi uma pessoa se referir a uma mãe que recentemente havia tido a experiência de ter tido o filho falecido, como “Ela perdeu um filho”. Não acho certo esse termo, pelo menos pra mim, esse não é meu caso, eu não perdi meu filho. Há exatamente um ano ele foi morar com Deus; eu e todas as pessoas que o conheceram, principalmente as que conviveram com o Julio Gabriel, sabemos que ele está junto de Deus…

No início, me diziam “Com o tempo vai diminuir a dor, vai amenizar”.. Hoje percebo que eram só palavras de conforto, não diminui em nada e, para completar, a saudade acompanha a dor, e nada vai tirar, nada que fizer vai trazê-lo de volta, o espaço no coração, na mesa, o quarto está ali, vazio…

Lembrei agora de uma frase do Chico Buarque: Saudade é arrumar o quarto do filho que já morreu. Em mim, essa prática se tornou uma rotina, arrumar os pertences dos quais tinha tanto ciúmes, de repente deixa tudo ali, agora guardado cuidadosamente em um baú, escolhido pela então namorada, uma vida inteira ali…

Me pergunto se valeu a pena correr tanto. Trabalhar tanto? Acordar no inverno as 6 da manha para comprar o carro de seus sonhos? Se soubesse, não teria cobrado tanta responsabilidade…

Um dia desses conheci uma mãe que teve a mesma experiência, ela sem saber nada de mim, e eu até ali também não sabia nada da vida dela, mas ela sentiu vontade de me contar que o filho havia partido há 7 anos (partido é um termo menos dolorido do que dizer a palavra morte). Ela estava com um bebê de 5 meses mais ou menos, tive a curiosidade de saber como ela superou, já que estava com uma nova vida ali em seus braços. Ela me respondeu, já com as lágrimas escorrendo: “Nunca superei, penso 24 horas em meu filho, cada um é cada um, cada um é único, ninguém substitui outro, posso ter mais 10, porém ele é único”. Comigo já fazia 5 meses, não falei de mim, não quis falar, me limitei a confortá-la, até porque sabia exatamente as palavras certas para tentar de alguma forma ajudá-la, porém percebi ali que nunca iria passar. Na verdade, como esquecer? Como passar uma borracha em cima de uma vida? Uma vida de amor, criada com amor…

Hoje, ha exatamente um ano, nada mudou, tem dias que não dá vontade de acordar, mas posso dizer que sou agradecida a Deus, por ter me dado um filho como o Gabriel, por isso a certeza que ele está bem, é um filho de Deus, voltou para Deus…Penso que quem morre somos nós, com certeza, literalmente, de todas as formas, até acho que deveria existir uma regra: pais deveriam ir antes dos filhos…

Tenho também a agradecer as pessoas que de alguma forma tentam ajudar, mandando emails de auto ajuda e de várias outras formas, posso dizer que uma coisa mudou, abri as janelas da casa, da alma, tenho conseguido ouvir as músicas de viola que ele mais gostava, trocar as fotos dos porta retratos, com uma nova maneira de pensar, só ainda não acredito na frase “Deus tinha algo melhor para você”.

Nada que venha de bom em minha vida será suficiente pra suprir o vazio que se instalou em mim, daqui pra frente cada coisa que conseguir não terá importância mais….

Se me perguntarem hoje se tenho ódio das pessoas que lhe tiraram a vida, diria que não, talvez porque são pessoas desconhecidas, nunca havia visto, ou talvez porque sou uma pessoa de amor, não de ódio, amor esse que ele herdou de mim, extremamente amoroso, confiante, alias hoje sei que foi aí onde errei, nunca tivemos maldades, desconfianças.

Porém, posso dizer que tenho sim uma grande revolta, até hoje nunca havia percebido como a justiça brasileira é falha, não sei muito falar sobre isso, até porque nunca tive motivos pra isso. Sou uma pessoa totalmente leiga nesse assunto, para mim o correto seria Injustiça Brasileira, porque dentro de uma lei onde diz que uma pessoa cruel e fria tira a vida de uma outra seria presa, existem várias outras brechas, onde ela pode ser solta, visitar família no natal, aguardar julgamento em liberdade e várias outras para que ele possa continuar a tirar a vida de pessoas inocentes. Vale ressaltar que, no meu caso, um dos assassinos já havia cometido outros crimes e estava solto. Não entendo isso, porque uma criatura desta estava solta??? Não entendo o porquê uma pessoa que comete um crime não cumpre sua pena até o final, porque criminosos têm tantos benefícios, vale citar aqui o “Auxilio Reclusão” ou seja um incentivo a criminalidades, um ser que pode tranquilamente cometer um crime sem medo de errar porque se acaso acontecer, a família estará amparada. É certo uma pessoa que tira a vida das pessoas ter um advogado pago pelo governo pra defendê-lo? E defendê-lo de que??? E nós as vitimas??? Quem tira a vida de pessoas deveria permanecer na cadeia, ficar fora de circulação, ha uns dias vi o caso de um marginal que havia sido preso por policias, não me recordo o motivo, me chamou a atenção a entrevista onde ele disse: “Logo to solto, não vai dar nada” e realmente já deve estar por aí tirando a vida de pessoas como vários casos de repercussão nacional.

Relembrando aqui o caso que acredito que muitas pessoas viram, o caso do ex-comandante do Corpo de Bombeiros em Curitiba, coronel reformado Jorge Luiz Thais Martins, suspeito de ter matado nove pessoas e baleado outras cinco, por motivo de ter tido o filho assassinado por drogados, e que até a presente data não foram encontrados, o pai nega, porém a revolta e a dor são visíveis no rosto do pai emocionado, carrega consigo a dor de ter tido o filho assassinado por marginais e ainda ser preso porque quer justiça. Que será de nós, pessoas do bem no futuro? Teremos que fazer justiça com as mãos? Afinal a própria justiça coloca em liberdade assassinos confessos, que adiantam investigações, procurar por assassinos para logo depois soltar? Eu posso um dia desses estar em algum lugar com o assassino de meu filho do lado (como disse antes nunca vi).

Resta-nos confiar na justiça divina, e isso sabemos que é certa, não falha…

Enquanto nada acontece, continuo levando a vida, claro que não da forma como planejamos, mas com a certeza que o Gabriel se tornou um anjo de Deus, um anjo que sei que está me dando forças para continuar…

Eu carrego a certeza que, mesmo passando uma vida inteira, o amor que sinto por você nunca deixará de existir…e é isso que vale a pena…o amor! Eu acredito muito no nosso reencontro…sei também que ainda o carregarei em meus braços outra vez…

Júlio Gabriel dos Santos Nunes (04.05.1990 / 24.06.2010)

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