21/10/2011 08h15 – Atualizado em 21/10/2011 08h15
- Artigo do Prof. MSc. Sergio Perius
O presente artigo foi desenvolvido para o programa de mestrado da Universidade do Oeste Paulista – Unoeste, atendendo a exigência para publicação em revistas científicas, pelo professor Dr. Levino Bertan.
Considera-se a Sociedade Contemporânea como aquela que apresenta características peculiares, que a diferenciam de todas as outras, pois vivemos numa época em que se relativizou praticamente tudo. Buscar por parâmetros para subsidiar o discurso do que é desprezível e o que é elogiável na atualidade requer sensatez e análise de tudo àquilo que é fato.
A discussão sobre os padrões que a sociedade deve assumir não é discurso do momento, já vem acontecendo há muito tempo. Pensando numa sociedade igualitária Marx propõe através do socialismo que todas as pessoas tivessem situação sócio-econômica igual. Esta igualdade também passa pelo campo do conhecimento. Esta proposta também teve seu revez, pois muitas pessoas refutaram esta ideologia. Afinal, na vida em sociedade sempre se teve ao que podemos chamar de bom ou ruim até porque o indivíduo participa no pensar acrescentando ao que os outros homens pensaram antes dele, conforme afirma Karl Mannheim (Sociologia e Utopia, p. 31).
Falar sobre o elogiável e desprezível na Sociedade Contemporânea é bastante desafiador, uma vez que, os tidos padrões cedem lugar para novos conceitos e estes por sua vez se transformam em regras e passam a regulamentar a vida na nossa sociedade como novo paradigma. Novas teorias sobre o relacionamento humano, namoro, casamento, famílias, entre outras, têm tomado proporções e com a influência significativa da mídia adquiriram força e as pessoas têm aceitado como normalidade.
Para falar sobre a sociedade contemporânea considerarei métodos de se estudar fenômenos da sociedade, o epistemológico e psicológico que ajudam explicar o significado e transformação do sujeito na sociedade. Considero como verdade a mudança da sociedade pelo sujeito. Entendendo assim que as transformações começaram embrionárias e hoje assumem conceitos considerados “verdades”.
Tanto o elogiável como desprezível têm significados diferentes em virtude da relativização da conduta da nossa sociedade. Fundamentando-me nos conceitos históricos para definir como elogiável e desprezível.
É desprezível, nojento e abominável, que pessoas explorem a ingenuidade, a ignorância ou até mesmo a boa intenção dos cidadãos para construírem, em nome do bem comum, carreiras políticas, abusando do poder que lhes é conferido, aproveitando da imunidade que a “lei” lhes garante, apropriando-se daquilo que não lhes pertence. Políticos ignominiosos, que se utilizam de má fé para obter vantagem. É desprezível a mentira, a falsidade, a hipocrisia a que assistimos, subestimando nossa capacidade crítica. Pedro Demo afirma que na história, e mais especificamente na do conhecimento humano, não é difícil constatar: quem sabe pensar, nem sempre aprecia que outros também saibam pensar. Vejo que nossa mídia influencia as pessoas de modo que elas não pensem por elas, não sejam autônomas, mas que pensem como alguém pensa.
Se analisarmos os meios de comunicação, observamos em alguns deles, exposição cada vez mais precoce, principalmente da mulher, promovendo a erotização precoce. Alguns instrumentos (televisão, internet) bombardeiam nossos lares com cenas de sexo quase explícito em qualquer horário. Além disso, as crianças são expostas a modelos de identificação altamente sexualizados: é a dança do bumbum, a top star que se insinua constantemente, a roupa justa e com brilho, os sapatinhos de salto alto. A erotização é um processo que contribui para a sexualidade adulta.
É elogiável que pessoas quando assumem responsabilidades no poder público zelam pela ética, moralidade, considerando que aquilo que é público realmente é de todos, falando a verdade sobre os fatos, mantendo coerência nos atos. É de causar estranheza como as pessoas reagem quando alguém realmente é verdadeiro, tem seus valores fundamentados na retidão, na justiça. Sendo que a ética não é só para as pessoas que ocupam cargo público. Mas para todo cidadão. É extremamente importante saber diferenciar a ética da moral e do direito. O varredor de rua que se preocupa em limpar o canal de escoamento de água da chuva; o auxiliar de almoxarifado que verifica se não há umidade no local destinado para colocar caixas de alimentos; o médico cirurgião que confere as suturas nos tecidos internos antes de completar a cirurgia; o atendente do abrigo de idosos que se preocupa com a limpeza de uma senhora idosa após ir ao banheiro; o contador que impede uma fraude ou desfalque, ou que maquia o balanço de uma empresa; os engenheiros que utilizam o material mais indicado para a construção da obra; o advogado que em nome da verdade e da justiça defende seu cliente. Todos estão agindo de forma eticamente correta em suas profissões. Ao fazerem o que não é visto, ao fazerem aquilo que ninguém saberá quem fez. Demonstra que estão preocupados, mais do que com os deveres profissionais, com as pessoas.
A Moral e o Direito baseiam-se em regras que estabelecem certa imprevisibilidade para as ações humanas. Porém, diferenciam-se. Moral estabelece regras que são assumidas pela pessoa, independe das fronteiras e garante identidade entre pessoas que sequer se conhecem, mas utilizam o mesmo referencial comum.
O Direito busca estabelecer o regramento de uma sociedade delimitada pelas fronteiras do Estado. Alguns autores afirmam que o Direito é um subconjunto da Moral, sendo que há conflitos entre Moral e Direito.
A Ética é o estudo geral do que é bom ou mal, correto ou incorreto, justo ou injusto, adequado ou inadequado, sendo um dos objetivos da ética a busca por justificativas para as regras propostas pela Moral e pelo Direito. É elogiável quando as pessoas compreendem e tornam prática de vida a Ética, a Moral e o Direito.
Desprezível é observar a inúmeros fatos no cenário nacional, fatos não só políticos, e que já não causam indignação nas pessoas. Isto mostra a permissividade que está presente na cultura da sociedade de um modo geral. É imprescindível estar sempre bem informado, acompanhando as mudanças nos conhecimentos, para evitar a sujeição incondicional.
A paz no mundo é desejo antigo da humanidade, considero elogiável a atitude de muitos homens e mulheres que se empenharam e se empenham neste sentido. O Papa João Paulo II enviou às igrejas e governantes de todas as nações no ano de 2003 uma mensagem sobre “a paz como compromisso permanente”. Ele recorda que, há mais de 40 anos, o Papa João XXIII escreveu a carta “Pace in Terris” endereçada a todas as pessoas de boa vontade. E na carta enviada às igrejas pelo Papa João Paulo II pronunciou-se contrário à ideologia dominadora dos Estados Unidos que anunciaram a “guerra preventiva” e pediu a toda a humanidade que impedisse o massacre dos povos indefesos e já martirizados pela pobreza. Esta carta não teve força coercitiva, tanto é que Bush não demoveu seus propósitos guerreiros. A paz no coração de cada um resulta do desejo e do esforço de cada ser humano.
As diferentes espiritualidades propõem caminhos para a conquista da paz interior. Jesus, quando se encontrava com os discípulos, saudava-os com as palavras “ a paz esteja com vocês”. Outra tradução seria “a paz se fixe em cada um(a) de vocês”. O Judaísmo nos educa a viver o Shalom de Deus, paz da aliança. O Budismo nos propõe a libertação do sofrimento pela renúncia dos desejos e o equilíbrio do coração. As palavras sábias de Tich Nhat Ham, monge budista nos conduzem a uma reflexão quando diz: “Quando cada dia começar, tome uma decisão no mais profundo do seu ser. Mesmo se uma montanha de ódio e violência cair sobre você, prometa-me, irmão, que lembrará: nenhum ser humano é nosso inimigo. Pode haver uma fera morando no coração de uma pessoa, mas não é pelo ódio que ela poderá se enfrentada ou vencida. (…) Mesmo sozinho, siga o caminho da paz e da reconciliação porque só o amor é imortal e vencerá. E, se você escolher colocar seus passos na pegada do amor, mesmo no caminho longo e difícil, o sol e a luz brilharão iluminando os seus passos”.
É desprezível que líderes em nome de seus interesses promovem guerras, destruição, interrompendo sonhos das crianças dos adolescentes, jovens e adultos. Aqueles que em nome do poder querem dominar os outros. Aqueles que em nome da religião promovem a fragmentação, justificam a morte, se é que existe justificativa para alguns atos estúpidos. Separam as famílias, promovem o terror e abortam os sonhos de um mundo de paz. Não podemos aceitar o conformismo, este também é desprezível. Luther King afirmava “eu prefiro ser louco do que em conformidade viver”. Condicionar-se a viver num mundo de conformismo é enterrar os sonhos de sociedade melhor, onde todos tem direitos, de crianças e idosos.
Idoso é o indivíduo, homem ou mulher, que já foi jovem, teve sonhos, trabalhou, lutou, viu o tempo passar e envelheceu. Construiu uma vida produtiva, porém, a velhice chegou. É momento de desfrutar da atenção dos familiares. É plausível que pessoas entendam e prestem a devida atenção para aqueles que a muito se doaram. Nos nossos dias existem excelentes programas para a terceira idade ou a melhor idade, bem como a ocupação nos trabalhos voluntários, que dão um novo sentido à vida. A dinâmica da vida moderna é diferente daquela de outrora quando a mulher-mãe ou os filhos cuidavam dos idosos. A mulher moderna trabalha fora de casa. Os filhos também envelhecem. O idoso passa a ser cuidado por enfermeiras ou é encaminhado para uma casa de repouso ou recuperação. Os velhinhos muitas vezes sozinhos, viúvos, ficam depressivos, esquecidos, tem dificuldade para comer, se sujam, precisando de ajuda contínua. O mais difícil e desprezível desta situação é o abandono por parte de alguns filhos. Um pai ou uma mãe pode cuidar de vários filhos, porém, vários filhos nem sempre cuidas de seus pais, diz a canção sertaneja raiz.
A educação escolar está no centro do processo da globalização da economia, das comunicações, numa época marcada pelas contradições, individualismo e mudança de paradigmas. É nesse cenário pós-moderno que a escola deve atuar, cenário que impõe novos desafios para os educadores. Certamente a educação deve estar voltada para a autonomia, a ética, para a valorização da diversidade cultural, para a busca da identidade. É elogiável que educadores compreendam este novo propósito da educação e função da escola. É agradável ver professores que investem na formação de pessoas criativas e inventivas, capazes de refletir, de ouvir o outro, de respeitar o diferente, de analisar situações e buscar soluções. Sem uma formação adequada do professor, nada muda. Aqui reside o ponto crucial de todo o processo: sem uma formação consistente, o educador não consegue conduzir com êxito o processo educativo. Na formação do professor pelo menos três aspectos são relevantes conforme a pedagoga Maria Lúcia Aranha: qualificação, formação pedagógica, formação ética e política. Com tantas possibilidades que existem ainda há quem, mesmo atuando na educação não confia a ela a credibilidade merecida, a estes trabalhadores não pode ser dado crédito, pois, não são agentes de transformação da sociedade, apenas reproduzem o que já existe. Outrora, para ser um bom professor, era bastante saber transmitir conhecimentos e exercer autoridades em sala de aula. O perfil do “bom” professor mudou. Em relação ao conhecimento não deva mais transmiti-lo. Sua obrigação é instigar o aluno, levá-lo a desenvolver a criatividade. O aluno agora é centro do processo, o professor deve mostrar-se amigo, mas não licencioso.
Da educação escolar, com seus sucessos e insucessos, passo para outro ambiente de formação, a família. É nesse ambiente que acontece o relacionamento entre pais e filhos. O dia-a-dia numa família é feito de encontros e desencontros, de alegrias e crises. A família é o principal modelo de comportamentos. Se a criança não o encontrar na própria casa, dificilmente construirá um bom conceito de família. É no seio familiar que a verdadeira educação acontece.
Os pais, muitas vezes, cometem erros. Criam seus filhos, dando-lhes mais do que tiveram e deixam de educá-los. Içami Tiba faz uma referência a este comportamento usando o seguinte exemplo: “quando eu era criança, meus pais permitiam que nós filhos comecemos a asa e pescoço do frango, crescemos comendo asa e pescoço, conhecemos alguém que cresceu comendo pescoço e asa, nos casamos, tivemos filhos, e, dissemos: quando éramos criança, comíamos asa e pescoço, logo, meus filhos comerão coxa, sobre coxa e peito, e nós continuamos a comer asa e pescoço”. Há uma inversão: pais se tornam obedientes. Uma das causas disso é que jovens não se preparam adequadamente para o casamento e, na iminência de se tornarem pais, tornam o enxoval do bebê a sua maior preocupação. Poucos de preocupam e lêem sobre o que é educar uma criança.
Os atuais pais receberam uma educação que seus próprios pais herdaram, de outra época distante. Alguns adultos aceitam as mudanças sociais, outros resistem e insistem em educar como foram educados, isto pode gerar conflitos na família.
Os jovens desejam viver com intensidade, com muita “adrenalina” e estão queimando etapas no seu desenvolvimento. É elogiável que pais e filhos saibam dialogar, os pais orientando-os para uma vivência saudável, com responsabilidade, ética na construção de uma sociedade cada vez melhor. É elogiável que os filhos saibam sentar com seus pais, compreendendo-os, ouvindo e seguindo ensinamentos.
Desprezível é observarmos que pais e filhos não desenvolvam diálogo saudável, permitindo discussões e por vezes fomentando a violência, agressões verbais e físicas. O resultado disso é conhecido.
Pessoas, diante de problemas agem e reagem de diversas formas, algumas procuram soluções no apoio em outros, mas há quem procura solucionar com alucinógenos, substâncias psicoativas. Por que as pessoas usam drogas? Na verdade são diversos fatores que contribuem para a drogatização: enfrentamento de problemas, curiosidade, socialização, pertencimento a determinado grupo, rituais religiosos, para relaxar e para obter prazer. É triste, desprezível que grupos organizados construam sua vida financeira na destruição do próximo. É louvável a ação daqueles que enfrentam a situação, orientado e esclarecendo as pessoas, prevenindo. O consumo de drogas tem ligações nas diversas esferas da sociedade, sendo complexo e que envolve uma série de fatores políticos, econômicos, culturais e sociais.
A educação preventiva em relação a saúde tem sido uma das formas de conter o uso de drogas, principalmente na idade escolar. As comunidades escolares têm desempenhado papel fundamental com experiências de comitês antidrogas, gincanas educativas, feiras de ciências, com ênfase na prevenção e na promoção de saúde. Outra forma de prevenir é a religião com suas várias formas de trabalho.
Religião é a “ligação” entre a essência do ser humano e a essência de Deus que é a comunicação. Santo Agostinho diz: “o nosso coração está inquieto enquanto não ‘repousa’ em Deus”. Não podemos negar que a humanidade, através da história, foi criando mil formas de cultuar o mistério divino. E nessas formas e ritos aparecem mortes onde deveria haver vida. Apareceu pecado onde devia abundar a graça e a felicidade. Mas isso é produto da limitação humana, da raiz do egoísmo, com seus diversos frutos, que gera tristeza, abandono, preconceitos, injustiças e desamor. A verdadeira religião não oprime nem aniquila o ser humano, mas encaminha para o seu destino temporal e eterno. A religião é caminho de amor e este conduz a salvação. É desprezível que façam guerra em nome de Deus, em nome de Alá ou quem quer que seja, representa o interesse próprio e nem está no propósito de Deus, faz da religião d barbárie, o terror, a guerra e esta gera morte, exatamente o oposto daquilo que Cristo diz: “Eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância”.
É triste verificarmos que em nossa sociedade existe, conforme citado por Leandro Haerter e Rita de Cássia Grecco dos Santos na Revista Mundo Jovem de Junho (2005, p.9), o apartheid educacional. Ter a necessidade de criar cotas para possibilitar a entrada de grupos pertencentes a minorias étnicas ou culturais na universidade é o cumulo de uma sociedade. Pode ser entendida como uma política de inclusão, aí tudo bem, mas cai-se em contradição com os próprios objetivos da educação, da Constituição Federal e talvez continuemos alimentando a barbárie citada por Adorno no livro Educação e Emancipação. As pessoas que necessitam de cotas realmente conquistam a emancipação, a autonomia? Nossa Constituição prevê que todos são iguais perante a lei. O apartheid educacional configura-se como um reflexo de má distribuição da renda, da negação de oportunidades, enfim, da postura do “faz-de-conta que está tudo bem”.
É elogiável que grupos organizados, procuram articular a nossa sociedade para combater o preconceito, o racismo. Proporcionando igualdade de condições e acesso daqueles que são considerados “diferentes”.
Poderia aqui relacionar muitas situações elogiáveis em pessoas. Quando da elaboração deste artigo passei a observar uma situação interessante. Atitudes elogiáveis se restringem normalmente a atitudes individuais ou a pequenos grupos organizados. Já o desprezível é mais massificado, talvez pela própria vulnerabilidade das pessoas que não tiveram oportunidades para uma formação crítica das coisas, ou aqueles que acreditam que “o proibido é mais gostoso”.
Só sei que o elogiável e o desprezível sempre existiram e continuarão existindo.
Encerro com frases de Shakespeare: “O que importa não é o que você tem na vida, mas quem você tem na vida(….) Descobre que leva anos para construir confiança e apenas segundos para destruí-la(…) Aprende que com a mesma severidade com que julga, você será em algum momento condenado”.
- Sergio Perius é graduado em Pedagogia, Especialista em avaliação e interdisciplinaridade pelo IBPEX/Curitiba, Mestre em Educação pela UNOESTE/Presidente Prudente, Professor, Coordenador e Diretor da Faculdade de Amambai – FIAMA.