11/09/2014 10h04 – Atualizado em 11/09/2014 10h04
Por Artur Salles Lisboa de Oliveira
A crise financeira de 2008 foi desencadeada pela engenhosidade de instituições financeiras que venderam ativos no mercado, cujos lastros eram os pagamentos das hipotecas. Quando a bolha imobiliária chegou ao seu limite e os preços das residências começaram a se depreciar, as famílias não tiveram alternativa senão entregar seus imóveis aos bancos. Como conseqüência, bilhões de dólares foram perdidos por bancos de todo o mundo em decorrência do calote financeiro.
Em um contexto dramático, caracterizado por famílias endividadas, trabalhadores desempregados, grandes empresas à beira da falência e pânico, as bolsas de valores derreteram em todo o mundo como reflexo de projeções sombrias quanto à economia global. O que movia os preços dos ativos, naquele momento, eram expectativas de ações governamentais firmes que contivessem o desespero dos investidores – algo altamente danoso para o setor produtivo e, por conseguinte, para os trabalhadores.
O governo norte-americano não tardou em lançar planos de socorro aos bancos, à indústria automobilística, ao setor imobiliário, sob o olhar desconfiado daqueles que foram os maiores prejudicados: os contribuintes. Em um salto extraordinário, os índices acionários recuperaram – alguns, inclusive, superaram – os patamares anteriores à crise financeira. A economia real ainda estava trôpega, mas os investidores ao redor do mundo não hesitaram em esticar os preços das ações negociadas em bolsa.
Quando tudo parecia mais calmo, a tal crise das dívidas soberanas acomete a Europa. Também algo promovido pela irresponsabilidade, sendo que desta vez os erros foram cometidos pelos governos, que sustentaram inúmeros benefícios para funcionários públicos por longos períodos de tempo. Enquanto as economias de diversos países europeus apresentavam condições favoráveis, a gastança era sustentada, em parte, pelo comércio exterior que assegurava a entrada de divisas. Em seguida a 2008, essa fonte de recursos foi drenada substancialmente.
Quanto à crise européia, há controvérsias: uns atribuem à Alemanha um papel fundamental no gerenciamento das questões econômicas por meio de inúmeros socorros oferecidos à Grécia, a peça fundamental de todos os problemas, apesar da economia diminuta. Por outro lado, outros acreditavam que o mal deveria ter sido extirpado sob o argumento que sem gregos para afundar a zona do euro, o bloco certamente seguiria um rumo melhor em direção ao crescimento. Os alemães preferiram bancar a manutenção grega.
O que se vê hoje nos mercados acionários, cujos rumos desempenham forte influência na economia real por meio da emissão de novos títulos ou dívidas por empresas necessitando de recursos para dar suporte aos seus projetos, é um comportamento altamente viciado e, por conseguinte, danoso. Com a injeção de bilhões mensais nos mercados mediante o Quantitative Easing (política de afrouxamento), os investidores se tornaram “dependentes” da política monetária a ponto de meras expectativas serem capazes de gerar grandes movimentos nas bolsas de valores.
Pior: os mercados agem como crianças mimadas, que “choram” quando sujeitos a perspectivas de recuo da política de afrouxamento monetário, mesmo quando a motivação para tal atitude é baseada em projeções melhores para a economia mundial. O raciocínio predominante se torna invertido, incoerente, o que prejudica em muito as decisões do empresariado quanto a investimentos produtivos em aquisição de bens para elevação da produção futura. Tudo fica de cabeça pra baixo com um mercado “viciado” no Federal Reserve.
O grande legado da crise financeira, apesar de não ser abordado com freqüência na grande mídia, é que caminhamos em passos largos para uma cultura da futurologia, no qual as pessoas não se importam tanto em produzir conhecimento ou novos métodos de produção, mas de apostar no futuro para um ganho financeiro fácil. E em parte essa tendência à adivinhação é fomentada por uma política equivocada – apesar de reconhecer a sua importância em alguns aspectos – que ao gerar movimentos obtusos e bruscos nas bolsas beneficia os grandes especuladores.