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segunda-feira, 25 de novembro de 2024

Conversa nada fiada

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07/04/2015 08h29 – Atualizado em 07/04/2015 08h29

Os Maias

Por Odil Puques

Chegara como sempre chegara. Largando tudo para tudo quanto é canto. Sapatos lá, meia acolá, camisa pelo sofá e numa felicidade que parecia extenuar-se, aconchegava-a para consigo. Que ninguém crêsse vá la, mas poderia sim ter ocorrido com ele.

Um simples e humilde pintor de paredes ter aquela diva todinha para si era improvável como sói acontecer em casos entre mundos. Tá certo tinha lá suas qualidades e atributos físicos que a maioria das pessoas não enxergava, mas por diversas vezes se pegou ao espelho admirando o nariz de anunco e a forte expressão que lhe emanava da tez. Tens personalidade no olhar lhe dizia a musa. O que quer que isso significasse, lhe admirava as palavras, o vocabulário rebuscado e aquela mania que os descobridores tem de começar todas as frases com um “Ora pois” e chamar de pequeno almoço o desjejum.

Conhecera-a na faculdade, ela estudando e ele a pintar, contratado que fora de última hora para terminar aquele bloco que a outra empresa tinha deixado inacabado. Olhares, conversas e alguns dias depois levou de vez as escovas para o que ela chamava de apartamento na verdade um quarto, sala e cozinhazinha entulhado de livros, fados e recordações do Tejo. Viera só. A mãe ficara. O pai dizia, era brasileiro aventurou-se como tantos em busca de melhores oportunidades e alguns euros depois retornara deixando naquelas terras a mais viçosa semente que iria nascer e frutificar para ser só sua. Por aqui chegou em busca dele de quem só tinha o nome e a cidade de origem, infrutífera a busca só não foi totalmente frustrada porque descobrira a vocação e esmerilhava-se para aprender a ensinar aqui ou acolá as primeiras letras aos pequerruchos.

De comum eram sós. O dele falecera já há tempos, a mãe se aventurou com outros e destes outro tantos do mesmo nariz cuja maioria sequer conhecia. Vivia a plenitude daquela relação, se tendo, impedindo de ter outro afazer que não daqueles versos que ela lhe lia e dizia ser o maior poeta dos dois mundos: É querer estar preso por vontade; É servir a quem vence, o vencedor; É ter com quem nos mata, lealdade. Mas como causar pode seu favor Nos corações humanos amizade; Se tão contrário a si é o mesmo Amor?

Um dia mais dia resolveu visitar o túmulo do pai e descobriu também nele uma tez semelhante que já vira em algum lugar e aos prantos aproveitou-se que ela estava a estagiar pegou suas tintas para ali nunca mais pintar.

O autor é advogado e escreve às terças feiras nesta coluna.

Odil Puques

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