13/07/2015 07h03 – Atualizado em 13/07/2015 07h03
Por Luiz Peixoto
“Nas grandes cidades, no pequeno dia-a-dia
O medo nos leva tudo, sobretudo a fantasia
Então erguemos muros que nos dão a garantia
De que morreremos cheios de uma vida tão vazia
Nas grandes cidades de um país tão violento
Os muros e as grades nos protegem de quase tudo
Mas o quase tudo quase sempre é quase nada
E nada nos protege de uma vida sem sentido”
(Humberto Gessinger)
Conheço muitas cidades, em vários Estados desse imenso Brasil. Umas morei. Outras apenas estive algum tempo. Capitais, metrópoles, cidades médias, pequenas, minúsculas. Em todas vi e vivi experiências boas e ruins.
Imagine a dificuldade que é pra um cara nascido e criado em Amambai, com suas ruas calmas, vizinhos conhecidos, amigos e familiares por toda a cidade, com seus 37.000 habitantes aproximadamente, num repente da vida, cair em Cuiabá – MT, capital quente, festeira, de noite agitada, comidas diferentes e um linguajar peculiar. Ou então imaginem esse mesmo cara, logo depois, ir morar em Brasília – DF, capital federal, de mais de 2 milhões de habitantes, tudo longe, tudo grande, gente de difícil relacionamento, cidade de alto custo de vida. E imagine ainda, na sequência, ir morar em Orizona – GO, cidade hospitaleira, terra de muita cachaça artesanal boa e famosa. Com seus 14.000 habitantes, sendo desses mais de 70% na zona rural. Isso pra ficar só nas três, se fosse descrever todas as cidades de Goiás, Piauí, Maranhão, Mato Grosso, Rondônia, Acre, Rio Grande do Sul, Amapá, Espirito Santo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Paraná, São Paulo, Santa Catarina, Sergipe, Pernambuco e Tocantins (sem contar o meu Mato Grosso do Sul) por onde andei esse seria quase um tratado de geografia, e não é a intenção.
E, depois de 24 anos de estrada, voltei para casa, para Amambai. A volta foi uma decisão pensada, visando ficar perto dos pais nesse processo natural de fim de vida. O choque foi imediato. Apesar de ser a minha terra, onde como dizem os antigos, meu cordão umbilical está enterrado, muita coisa diferente. Os amigos do passado, ou foram embora, ou seguiram suas vidas, construindo família e carreira que não temos em comum.
Das muitas coisas que me fazem falta, listo apenas as principais:
Filmes: para um cinéfilo, ficar longe dos cinemas é um desafio. O mais próximo é em Dourados, e com uma seleção de filmes para atender ao mercado e não a cultura. Locadora? Se existe alguma ainda não achei. Então o que resta é pedir filme via internet (e esperar em média 30 dias pela entrega sem entender porque tanta demora) ou apelar para o ilegal (ou DVD pirata que tem de monte, ou baixar mesmo da internet); uns dirão que existem as TVs por assinatura, pois é, mas o custo/benefício ainda não compensa.
Internet: Para quem sempre teve acesso a internet de alta velocidade, ter uma de 10 megabytes (que na prática não chega a 5) é um desafio. Não entendo o monopólio da empresa OI. A livre concorrência não é base do sistema capitalista? Porque não aqui também…
Livros: Apesar de termos algumas opções nas livrarias da cidade, não existem variedades, são apenas os da moda. De novo a opção é ir a Dourados ou comprar via internet, esperando os 45 dias em média de entrega.
Shows: Para quem não gosta do chamado sertanejo-midiático não há opção. Nem aqui nem no entorno. Então resta ouvir o que tem, no DVD ou nos CDs acumulados. E tentar ainda assim acompanhar o cenário musical.
Mas não quero reclamar da minha cidade. Sou feliz aqui. Cercado de gente conhecida. Dando (vendendo! Por mais barato que seja, não é de graça) minhas aulas, conhecendo e reconhecendo gente nova e antiga. Cuidando e dando atenção a pai e mãe. Criando meus cachorros e cultivando minhas plantas.
A cidade continua linda. Não tão calma como no passado, nem tão tranquila. Basta ver que já me roubaram um bicicleta do quintal, coisas da vida (eu que não a guardei dentro de casa, dei mole). Andando na rua, coisa que faço muito, me deu essa curiosidade.
A cidade é nossa. Nossa casa, nossa terra, nosso lar. Nosso, dos amambaiense e dos que adotaram esse terra. Então porque tanto descuido com nossa cidade?
Porque as pessoas, que moram aqui, jogam tanto lixo nas ruas e terrenos baldios? É fácil jogar a responsabilidade sobre a prefeitura, mas o lixo não aparece lá por ato mágico. Alguém joga! E olha que a cidade tem serviço regular de coleta. Tudo bem que ainda faltam lixeiras nas ruas, as que tem estão depredadas e não foi por ação mágica também, foi ação de quem mora aqui. No fundo somos todos corresponsáveis!
Porque tanto entulho e galho de arvores nas calçadas? A prefeitura, através da secretaria de serviços urbanos, passa e recolhe. No dia seguinte aparece de novo, magicamente, galhos, entulhos, nas ruas, nas esquinas. E aí, de novo, coloca-se a responsabilidade na prefeitura. No fundo somos todos corresponsáveis!
Porque tantos terrenos abandonados no espaço urbano? A minha região da cidade tem vários terrenos baldios, acumulando lixo, entulho e mato. É função do proprietário mantê-los limpos. E a maioria não o faz. Ai vem a dengue, culpamos o poder público, vem a chikungunya, culpamos o poder público, vem a leishmaniose, culpamos o poder público. Mas, no fundo, somos todos corresponsáveis!
Isso sem falar em calçadas inexistentes ou quase sempre em péssimo estado; além do costume do comércio de ocupa-las com mesas e cadeiras, com móveis, com veículos. Sem falar na falta de ciclovia, levado as pessoas a andarem de bicicleta, e aqui sempre teve muita, nas calçadas, quase atropelando quem anda. No fundo somos todos corresponsáveis!
A cidade é nossa. Assumamo-la como tal. Ou seguiremos sempre achando responsabilidade nos outros. No fundo somos todos corresponsáveis!
O autor é graduado em Filosofia, na UCDB (Universidade Católica Dom Bosco), Especialista em Pedagogia da Alternância, pela Universidade Católica de Brasília, e professor da UEMS (Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul) de Amambai.