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domingo, 24 de novembro de 2024

Plantas Daninhas: resistentes, tolerantes e de difícil controle

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07/08/2015 16h38 – Atualizado em 07/08/2015 16h38

Plantas Daninhas: resistentes, tolerantes, de difícil controle – O que está acontecendo?

Por: Germani Concenço e Júlio Cesar Salton¹

A agricultura surgiu quando o homem deixou de ser nômade e fixou-se em determinadas regiões, iniciando o cultivo do próprio alimento. Até este momento, grupos migravam com rebanhos em busca de pasto. Foi também nessa época que as plantas daninhas surgiram, representadas por aquelas espécies vegetais que cresciam espontaneamente dentre as cultivadas, competindo por recursos como água, luz e nutrientes.

Até os séculos XVIII e XIX, as plantas daninhas eram eliminadas da lavoura por arranquio manual, capina com instrumentos simples ou por equipamentos rudimentares tracionados por animais. Embora sua ocorrência se constituísse problema na agricultura rudimentar, antes do século XVIII não havia consciência clara do nível de impacto da ocorrência de plantas daninhas na redução da produtividade das culturas, e seu manejo era frequentemente negligenciado.

No século XVIII, a ocorrência de plantas daninhas era intensa, e as perdas decorrentes de sua presença foram reconhecidas dentre os maiores limitantes à produtividade – respeitados os limites genéticos dos materiais cultivados naquele período. A escassez de alimentos devido à redução da força de trabalho decorrente de migração do campo para a cidade exigiram uma solução para este problema; a oferta de mão de obra passa a ser limitada e cara.

Na época, a solução encontrada foi a integração da agricultura com a pecuária, onde a diversificação do ambiente de produção proporcionaram a redução da ocorrência de invasoras para níveis aceitáveis devido à deposição de restos vegetais, à rotação dos cultivos, ao uso da adubação orgânica, ao pisoteio dos animais e por fim ao plantio de espécies com propriedades alelopáticas (embora este princípio ainda fosse desconhecido) sobre plantas daninhas. Esta foi a “Primeira Revolução Agrícola”.

No século XIX e início do século XX a cura para doenças antes letais e a redução das taxas de mortalidade neonatais, dentre outros fatores, aumentaram a taxa de crescimento e a expectativa de vida da população, culminando em uma explosão demográfica e na proporcional demanda por alimentos. Os níveis de produtividade da época não teriam condições de atender à demanda sem aumento radical na área cultivada, que por sua vez era limitado pela escassez de mão de obra. Foram então idealizados sistemas de cultivo intensivos embasados no uso de fertilizantes e pesticidas, melhoramento genético e aprimoramento nas técnicas de irrigação – esta foi a “Segunda Revolução Agrícola”, mais comumente denominada “Revolução Verde”.

A Revolução Verde proporcionou aumento nas produtividades e supriu a demanda imediata por alimentos, mas em contraponto, verificou-se redução da importância da rotação de culturas, progressivo abandono da adubação verde e do uso de esterco, na separação da produção animal e vegetal e, principalmente, na absorção de alguns processos agrícolas pelas indústrias. Isto, como era de se esperar, trouxe de volta o fantasma das altas infestações por plantas daninhas e perdas de produtividade por competição, que havia sido desvanecida nos séculos XVIII e XIX.

Seleção natural e fator humano

A teoria da evolução de Darwin estabelece que a seleção natural está embasada na variação genética. Os seres são diferentes entre si, mesmo os pertencentes à mesma espécie – desde que não sejam clones. Se todos os exemplares da mesma espécie possuem determinada característica, ela pode proporcionar maiores chances de sobrevivência àquela espécie comparada às demais em situações específicas; assim, não se inibe plantas por inundação se elas forem tolerantes ao encharcamento, nem se controla espécies daninhas de folhas largas com herbicidas graminicidas.

Existem, porém, espécies que eram controladas pelos herbicidas, mas deixaram de ser controladas a partir de determinado momento: as chamadas plantas resistentes. A buva e o capim-amargoso são os exemplos mais marcantes de plantas resistentes na agricultura tropical brasileira. Além da variação genética à qual a seleção natural está atrelada, esta variação – herdável pelos descendentes –, não seria necessariamente vantajosa se não proporcionasse ao vegetal alguma característica que aumente sua chance de sobrevivência. No caso das plantas resistentes a herbicidas, uma mutação genética pode ter resultado na menor absorção do herbicida pelas folhas, menor transporte ao local de ação, maior degradação ou mesmo o local de ação do herbicida pode ter sido alterado pela mutação genética da planta.

Resumidamente, aproximadamente 70 anos após a idealização da revolução verde, a agricultura se encontra novamente atolada na ocorrência de pragas, agora resistentes ou tolerantes aos agentes de manejo. Dentre estas, destaca-se a ocorrência de plantas daninhas de difícil controle.

Evidentemente não há solução simples para o problema das plantas resistentes; elas também não surgiram ou foram selecionadas por culpa das tecnologias atualmente utilizadas na agricultura, mas sim pelo seu uso equivocado. A melhor solução? A história mostra que o primeiro passo é voltar a integrar agricultura e pecuária – em bases muito mais modernas, evidentemente. Devemos abolir os herbicidas? De forma alguma. Herbicidas são manejados segundo técnicas estabelecidas por nós, profissionais da lavoura. Logo, o fator causador dos problemas com plantas daninhas, da seleção de plantas tolerantes e biotipos resistentes a herbicidas é o fator humano.

O primeiro ponto é o preparo dos nossos técnicos. Embora não seja garantia da seleção de bons profissionais, uma prova similar à atualmente adotada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) aplicada à agronomia poderia contribuir para uma responsabilidade técnica maior, com respaldo do nosso sistema Confea/Crea’s (Conselho Federal de Engenharia e Agronomia/Conselho Regional de Engenharia e Agronomia). Tecnicamente, faz-se necessário que os profissionais conheçam os grupos químicos herbicidas para rotação de princípios ativos com preferência àqueles de menor risco para evolução de resistência. O primeiro ponto, portanto, resume se em habilitar o profissional a fazer uma recomendação de manejo confiável e acertada.

O segundo ponto diz respeito a quem recomenda herbicidas e técnicas de manejo de plantas daninhas. Técnicos de empresas fabricantes de herbicidas e de suas revendas são geralmente bem formados, conscientes das tecnologias e bem treinados, mas naturalmente podem se restringir a recomendar produtos das suas empresas. Opção mais adequada ao produtor rural que não tem um engenheiro-agrônomo na propriedade é a consulta aos técnicos da sua cooperativa, uma vez que tal profissional ao conhecer um maior rol de produtos e ser isento de comissão por vendas, possibilita a utilização mais diversificada de herbicidas.

O terceiro ponto refere-se ao “encantamento” do produtor rural por soluções que vêm em frascos oferecendo resultados imediatos; por isso, ele não pode ser acusado. Quando seu capital está em risco, medidas cujos resultados são mais facilmente visíveis serão sempre preconizadas – o chamado “efeito paraquat”. O produtor quer ver a planta agonizando horas após a aplicação do herbicida. Mas, às vezes, efeito mais demorado, porém mais profundo, pode ser a solução. Assim, muita palha no sistema ao longo de todo o ano e uso de espécies com potencial alelopático pavimentam o caminho para a maior eficiência dos herbicidas. Cabe a um profissional embasado tecnicamente e isento de tendências, a recomendação destas soluções para a sustentabilidade da agricultura.

O novo advento da integração lavoura-pecuária (ILP) e de suas variantes após
dois séculos mostra que, mesmo atenuados pela revolução verde, problemas fitossanitários que culminam no défice de alimentos foram se acumulando, e portanto devemos voltar às bases diversificadas de produção. Isso enfraquecerá os fatores majoritariamente responsáveis pela seleção de plantas daninhas de difícil controle, sejam elas tolerantes ou resistentes aos herbicidas.

Para manejar estes sistemas complexos de produção, o técnico terá que possuir excelentes bases em fisiologia, climatologia, matemática, química, física e nas matérias técnicas para que as recomendações sejam de fato integradas e proporcionem o maior benefício ao conjunto do sistema produtivo. E, sim, os herbicidas continuarão fazendo parte destes sistemas integrados de produção, exigindo-se ainda mais conhecimento e responsabilidade em seu uso para evitar danos aos demais componentes do sistema produtivo.

Aliado à priorização de profissionais habilitados, treinados e isentos para sua recomendação, está o correto posicionamento das técnicas de defesa fitossanitária que avançam diariamente. A perspectiva integrada obrigatoriamente abrange todas as opções de manejo, incluindo o controle químico. A soja tolerante ao herbicida 2,4 D não resolverá definitivamente o problema da buva, nem a adoção de sistemas integrados ocasionará o desaparecimento do capim-amargoso, se forem utilizados como tecnologias isoladas. O segredo é o correto posicionamento das tecnologias no sistema produtivo – não sua abolição.


1. Pesquisadores da Embrapa Agropecuária Oeste

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