10/12/2018 22h57
Por Fausto Matto Grosso
UM FALSO TSUNAMI
Antes da eleição de Bolsonaro, a imensa maioria dos analistas e das lideranças políticas apontava que o capitão era um candidato inviável. Poderia até ir ao segundo turno, mas seria derrotado ao final. Quem de nós não se enganou, também.
O resultado eleitoral, nos primeiros momentos, parecia um tsunami. Algo inesperado, que surgia de surpresa, destruindo tudo pela frente. Mas, era um falso tsunami. Suas premissas já estavam sendo construídas há tempo. Era só olhar para a Europa, para a eleição de Trump, assim como para as jornadas de junho de 2013. A globalização fundia todos esses fatos.
Na Grécia, o Syriza, um partido socialista, para as eleições de 2019, está 20% atrás do ultradireitista Nova Democracia. Para o Parlamento italiano, o Partido Democrático (ex-PCI), encontra-se atropelado fortemente pelo partido direitista 5 Estrelas para a disputa de 2019. Na França assistimos o último exemplo da implosão dos partidos tradicionais, com o novo La République en Marche, que hoje domina o Parlamento e tem Macron, a ocupar o Champs-Élysée. Ao mesmo tempo ressalta-se o nítido crescimento do Frente Nacional, de Marine Le Pen, atualmente em segundo lugar.
Em 2017 aconteceram, na Europa, eleições presidenciais chaves, nas quais os partidos de extrema direita, embora derrotados, tiveram grande crescimento e ameaçam o futuro. Na Alemanha, o partido Alternativa para Alemanha se tornou a terceira maior força política no parlamento alemão. E, na Holanda, o Partido para a Liberdade ficou em segundo lugar no pleito. Polônia e Hungria são países cujos governos são considerados de ultradireita;
Resta a exceção de Portugal governado desde fins de 2015 por uma coalizão política de esquerda, liderada, do Partido Socialista. Tão deslocada do panorama europeu que é conhecida como “a geringonça”. Essa articulação é citada como modelo por muitos líderes do PT, entre eles Tarso Genro, que tentam articular aqui uma frente de esquerda.
Seria viável, uma solução à la portuguesa, aqui no Brasil? Segundo Theófilo Rodrigues (UFRJ) o Bloco de esquerda em Portugal tem 53% da Assembleia da Republica, no Brasil, tem pouco mais de 23% da Câmara dos Deputados. Falta muito para isso.
Parodiando Paulinho da Viola, as coisas estão no mundo globalizado, só que é preciso aprender.
Outra questão importante para compreender a vitória de Bolsonaro, é perceber as mudanças provocadas pelas novas tecnologias de informação e comunicação. O eleitor é outro e a política tradicional não entendeu isso. Bolsonaro parece que sim.
Vivemos outro momento, com outros cidadãos e com outros eleitores. Hoje convivemos com a cidadania líquida, que não tem passado, tampouco tem futuro, é o aqui e agora radical.
Nessa nova sociedade do consumo, somos adoria a nos expor nas redes sociais, absolutamente vulneráveis às fake-news, o que, aliás, não é novidade na história.
O historiador Robert Darnton (Harvard) conta que as notícias falsas são relatadas pelo menos desde a Idade Antiga: “Procópio foi um historiador bizantino do século VI, famoso por escrever a história do império de Justiniano. Mas ele também escreveu um texto secreto, chamado “Anekdota”, e ali ele espalhou “fake news”, arruinando completamente a reputação do imperador Justiniano”.
Com as redes sociais é possível disseminar informações discriminatórias e violentas que seriam excluídas pelos meios de comunicação tradicionais. Porém, nas redes sociais, esses conteúdos circulam com mais facilidade. Até quem inventou a mentira acaba acreditando nela.
Se fosse adepto da teoria da conspiração, estaria procurando quem passou a Bolsonaro, a tecnologia de mapeamento dos algoritmos, ou seja, da cabeça dos eleitores. Ele fez um discurso individualizado à cada eleitor-consumidor, esse, ávido por resolver o seu problema ou frustação imediatas. Se isso ainda não aconteceu, devemos nos preparar, porque brevemente as eleições poderão ser disputadas pelos algoritmos.
O problema é quem está por trás deles.
Fausto Matto Grosso/Engenheiro e professor aposentado da UFMS