04/05/2020 22h57
Ataques ocorreram durante manifestação pró-ditadura, no domingo (3); Polícia Civil do DF também investiga o caso
Fonte: Cristiane Sampaio/Brasil de Fato
O procurador-geral da República, Augusto Aras, oficiou o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MP/DFT), nesta segunda-feira (4), para pedir uma investigação sobre o caso dos jornalistas agredidos por manifestantes bolsonaristas no domingo (3), na capital federal. O ataque ocorreu durante mais um ato pró-ditadura realizado por seguidores do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que também participou do protesto.
O documento assinado por Aras é endereçado à procuradora-geral de Justiça do MP/DFT, Fabiana Costa Oliveira Barreto, chefe da instituição. “Tais eventos, no entender deste procurador-geral da República, são dotados de elevada gravidade, considerada a dimensão constitucional da liberdade de imprensa, elemento integrante do núcleo fundamental do Estado Democrático de Direito”, afirma Aras no ofício, ressaltando também que a agressão ocorreu na data em que se comemora o Dia Mundial da Liberdade de Imprensa.
Durante a cobertura do protesto, pelo menos dois repórteres e dois fotógrafos foram violentados por manifestantes. Segundo o Sindicato dos Jornalistas do Distrito Federal (SJPDF), que acompanha o caso, os relatos que chegaram à entidade dão conta de que as agressões incluíram socos, empurrões e pontapés, além de xingamentos.
Durante a confusão, o fotógrafo Dida Sampaio, do jornal O Estado de São Paulo, por exemplo, foi derrubado de uma escada enquanto fotografava o presidente. Ele levou socos e chutes no estômago e precisou ser socorrido para o hospital. Ao tentar ajudar o amigo, o fotógrafo Orlando Brito, de 70 anos, foi empurrado e teve os óculos quebrados. Integrantes de equipes de apoio também foram agredidos e os profissionais precisaram ser retirados do local por agentes da Polícia Militar (PM).
O caso gerou uma série de críticas e manifestações oficiais por parte de autoridades do Judiciário, do Congresso Nacional e da sociedade civil organizada. Após as intensas provocações, a Polícia Civil do Distrito Federal anunciou, nesta segunda (4), que vai investigar o caso.
A presidenta da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Maria José Braga (Zequinha), sublinha que a entidade e os sindicatos que reúnem membros da categoria defendem que esse e os demais casos de agressão a profissionais de imprensa sejam denunciados em duas vias, a do repúdio público e a da formalidade, por meio da cobrança de investigações junto aos órgãos competentes em cada situação.
“Isso é muitíssimo importante pro fim da impunidade, e a impunidade, como sempre lembra também em suas campanhas a Federação Internacional dos Jornalistas, é o combustível da violência”.
Escalada
Juliana Nunes, da coordenação-geral do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Distrito Federal (SJPDF), lembra que o episódio de domingo vem na esteira de outras diferentes ocorrências de agressão a profissionais de imprensa que têm sido registradas no país.
“Vários sinais foram dados. É uma escalada de violência contra os jornalistas, contra a imprensa brasileira, então, infelizmente, foi uma agressão física, uma agressão mais grave, que a gente, de certa forma, já imaginava que poderia acontecer. Outros episódios de agressão verbal e também empurrões, por exemplo, aconteceram nos últimos dias”, afirma a dirigente, ao mencionar ocorrências registradas na sexta-feira (1º), quando profissionais de imprensa que cobriam um protesto na Esplanada dos Ministérios foram agredidos por bolsonaristas.
Na ocasião, um grupo de cerca de 60 enfermeiros se manifestava em prol do isolamento social e em memória dos profissionais de saúde que morreram vítimas de coronavírus. Eles também foram agredidos por apoiadores do presidente. Entidades de trabalhadores da categoria estão buscando reparações judiciais para o caso.
Na mesma linha de atuação, o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do DF também vem se mobilizando para que os manifestantes que agrediram as equipes no domingo sejam punidos. A entidade oficiou, nesta segunda-feira (4), a Secretaria de segurança Pública do Distrito Federal e o Ministério Público.
Paralelamente, o Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência da República também foi acionado por conta de denúncias envolvendo diferentes ataques a profissionais de imprensa no Palácio da Alvorada, residência oficial de Bolsonaro e ponto de encontro de apoiadores do presidente.
“É fundamental que o Ministério Público Federal esteja se mostrando atento a tudo isso e esperamos que as investigações dos diferentes órgãos de fato apontem os agressores, e não apenas individualmente. É importante que apontem também em quais grupos eles estão inseridos, pra que seja feita uma ação efetiva de combate a essas agressões, tanto no ambiente virtual quanto nas ruas”, afirma Juliana Nunes.
Bolsonaro
Durante o protesto de domingo (3), ao ser avisado por um assessor que uma equipe da TV Globo estava sendo expulsa do local, o presidente Jair Bolsonaro minimizou o fato. “Também condenamos a violência. Contudo, não vi tal ato, pois estava nos limites do Palácio do Planalto e apenas assisti a alegria de um povo que, espontaneamente, defendia um governo eleito, a democracia e a liberdade”, disse o mandatário.
Depois, durante conversa com seguidores na porta do Palácio da Alvorada, o presidente se referiu ao ato como “uma manifestação espontânea da democracia” e disse que os ataques seriam de “algum maluco” que, segundo ele, “deve ser punido”.
Desde sua atuação como parlamentar na Câmara dos Deputados, onde teve mandato durante quase 30 anos, Bolsonaro é associado a manifestações de ataques a jornalistas e à liberdade de imprensa. Segundo levantamento da Fenaj divulgado no domingo (3), somente nos quatro primeiros meses deste ano o presidente proferiu 179 agressões do tipo. Foram 28 ocorrências de agressões diretas a jornalistas, duas direcionadas à federação e 149 tentativas de descredibilização da imprensa.
Edição: Rodrigo Chagas