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sábado, 23 de novembro de 2024

As feministas, os homens e a ministra

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17/01/2019 08h17

As feministas, os homens e a ministra, por Loreni Giordani

Por Loreni Giordani

Hoje, acidentalmente, acabei abrindo um vídeo da Ministra da Mulher. Honestamente, preferia não tê-la. E, então, após ouvir uma pregação em que ela diz que as feministas não gostam de homens porque são feias, porque nenhum homem quis casar com elas e, segue desenvolvendo seu raciocínio, fiquei pensando o que esta pobre mulher pensa sobre feminismo e sobre ela mesma e suas companheiras. Pensei sobre mim e sobre outras feministas que conheço. Todas nós gostamos muito de Homens, assim, com H maiúsculo.

Fiz uma retrospectiva sobre meu “gostar de homem”. E voltei no tempo. Talvez, meu apreço por eles tenha como primeira motivação aquele me deu vida. Que homem! Um exemplo de pai e de cidadão. Ele soube nos proteger. Nunca, em nossa casa, existiu um pastor, ou qualquer outro personagem que nos violentasse ou colocasse em risco nossa integridade. Quando, ainda adolescente, ouvi falar sobre estupro (e nem era esta a palavra usada), foi com meu pai que fui tirar minhas dúvidas, já que minha mãe morria de vergonha de falar sobre sexo. Lembro de nós dois sentados na escada da varanda e ele me explicando o que era aquilo e como eu deveria me defender.

Lembrei de outro episódio, quando ainda na pré-adolescência, me levaram do colégio de religiosos para “confessar”. Eu ainda não sabia direito nem o que era o tal de pecado, mas havia decorado o rol que me passaram na catequese, pois, naquela época, se não soubesse não haveria primeira comunhão e eu, aos oito anos, era louca para vestir aquele vestido de princesa e colocar uma coroazinha com um véu na cabeça. No confessionário, um padre inconveniente me fez perguntas sobre minha sexualidade. Quase morri de vergonha. Ao chegar em casa relatei o fato para minha mãe, que virou uma fera e me proibiu de novas confissões com aquele velho padre. Enfim, meu lar sempre me ofereceu proteção, a proteção que toda criança deve ter.

Saí de casa para estudar ainda criança. E isto foi decisão de minha mãe, que não queria que suas filhas enfrentassem as dificuldades que ela enfrentou pela falta de letramento. Mas, meus pais sempre tiveram cuidado em saber onde me deixariam e quem assumiria a responsabilidade pelos meus cuidados.

Na adolescência, paquerei e fui paquerada, me apaixonei, como uma garota normal. Namorei, amei e fui amada intensamente e me casei por amor. Divorciei quando o amor se foi, não por causas naturais. Tenho amigos e conheço Homens maravilhosos que me dão mil motivos para gostar deles.

Em meus sonhos de adolescência sempre quis ser mãe de menino. Fui abençoada com dois. Foi tão fácil educá-los! Fui e sou tão feliz com eles. Quando mostro arrependimento por sido muito dura com eles, me alforriam, sempre. Sou mãe de dois Homens, que amam e protegem suas filhas e que, até onde sei, amam suas esposas.

Lembro de um dia que meu filho chegou muito mal do trabalho. Jogou-se no sofá e ali ficou, cabisbaixo e mudo. Servi a mesa e o chamei para almoçar. Então, ele me disse: “Não quero mãe! Hoje atendi uma ocorrência terrível, uma menininha da idade da minha filha (três anos) foi violentada e morta. O corpinho estava lá, todo machucado. A cena não me sai da cabeça. Fico pensando na minha.” Para mim, é inevitável pensar que quem ama cuida. Assim é uma família que têm valores sólidos e não aquelas que desde cedo aprendem a se corromper juntos.

E aí, lembrei de tantas outras feministas que conheço, companheiras de militância, mulheres muito bem casadas, casamentos que duram dez, vinte, trinta, quarenta e até cinquenta anos, mulheres lindas, que, assim como eu, gostam de Homens, que, assim como eu, foram e são amadas, mulheres felizes e bem resolvidas, mulheres empoderadas. Nem mesmo minhas amigas LGBT andam bradando contra os Homens. O que nos move não é nenhum sentimento de aversão aos Homens, o que nos move é o desejo de que também os homens, assim, com h minúsculo, os machistas, os agressores, os opressores, os homofóbicos, os racistas, aprendam a tratar suas companheiras com respeito, sem violência, com reciprocidade em suas lutas, com solidariedade com relação aos filhos e a vida no lar. E não apenas as companheiras, mas todas as mulheres, todas as pessoas.

Nossa luta é, também, por mulheres como a Ministra, que não se comovem com a companheira que sofre pelo machismo que ela defende e legitima, mulheres que sofrem violência e não têm a quem recorrer, mulheres que como ela, foram vítimas de estupro dentro dos próprios lares, na infância, violência, muitas vezes acobertadas pela família, assim como foi a que ela diz ter sofrido.

Nossa luta é pela mudança desta cultura que ela, lamentavelmente, juntamente com seus pares, quer manter. Nós queremos casais que se amem, que se respeitem, que vivam com dignidade e com igualdade de direitos e de deveres. Nós queremos mulheres conscientes do valor que têm, conscientes de que não precisam sofrer agressão dos companheiros e suportar caladas.

Nós sabemos que machismo não é antônimo de feminismo e nós amamos e temos orgulho de todos os Homens feministas e aqueles que reconhecem que têm pensamento machista, mas que querem se reeducar.

Nós doamos nosso tempo por uma sociedade em que condutas machistas sejam abolidas e que não haja mais necessidade de luta feminista. Mas, enquanto uma só de nossas companheiras sofrer violência e for oprimida, enquanto uma única mulher for vítima de feminicídio, nossa luta será feminista e continuaremos lamentando pela existência de homens e mulheres que pensam, falam e agem como a “Ministra da Mulher”. Que triste escolha!

Todas nós temos sólidos valores familiares, bem mais sólidos que os da Ministra e seus pares, tanto que queremos famílias em que o amor seja a mola mestra, em que as mulheres tenham o direito de viver com dignidade e que o surgimento de sinais de envelhecimento não as tornem objetos descartáveis, como temos visto nos altos escalões da República em que o dinheiro e o poder ditam a idade da companheira, figura “bela, recatada e do lar”.

NÓS SOMOS MULHERES DE LUTA, SOMOS FEMINISTAS, CONHECEMOS NOSSO VALOR E POR ISSO, SOMOS LINDAS.

Loreni Giordani – Dourados, 16.01.2019

As feministas, os homens e a ministra

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