09/06/2021 22h28
As cidades de Manaus, o distrito de Cacau Pirêra, em Iranduba, Careiro Castanho e Parintins, no Amazonas, foram alvo de ataques de traficantes da facção Comando Vermelho por oito horas
Fonte: Revista IHU On-Line
Os ataques começaram por volta da meia-noite de sábado (5), segundo a Secretaria de Segurança Pública do Amazonas, com incêndios de 21 veículos e depredação de prédios públicos, que ocorreram em retaliação à morte de um traficante e líder do Comando Vermelho, Erick Batista Costa, o “Dadinho”. Ele morreu em uma troca de tiros com militares da Rocam (Rondas Ostensivas Cândido Mariano) da Polícia Militar, na mesma noite.
A reportagem é de Kátia Brasil e Cícero Pedrosa Neto, publicada por Amazônia Real, 06-06-2021.
Em Manaus, as cenas de terror dos incêndios se prolongaram pela madrugada de domingo (6) até às 8h15 (9h15 de Brasília), assustando moradores de 11 bairros. Os traficantes atearam fogo em uma agência bancária, um comércio, um transformador de energia elétrica, 17 veículos, entre os quais uma viatura da PM, uma ambulância do Samu (Serviço Móvel de Atendimento de Urgência), um trator particular e 14 ônibus e micro-ônibus de passageiros.
Segundo o Corpo de Bombeiros, às 2h15 desta madrugada bombeiros militares realizaram atendimento pré-hospitalar em um homem de 62 anos de idade, que havia inalado muita fumaça após os traficantes atearem fogo ao comércio dele. “A vítima recusou ser conduzida ao hospital. No local, houve perdas materiais, dentre documentos e alimentos. O fogo consumiu parte do forro do estabelecimento”, diz o governo. Não há informações de pessoas feridas nos ataques. Ninguém foi preso pelos crimes.
Durante os atentados, os criminosos chegaram a fazer barricadas e atearam fogo em pneus na Avenida Brasil, acesso principal do bairro da Compensa, na zona oeste de Manaus, impedindo o fluxo de veículos. Por conta das ameaças aos motoristas de coletivos, a frota do transporte público deixou de circular, segundo moradores.
Os atentados se estenderam a outros três municípios. Em Cacau Pirêra, distrito de Iranduba, na Região Metropolitana de Manaus, segundo o 31o. Distrito Policial, os traficantes incendiaram três ônibus e um veículo dentro de uma garagem da empresa de transporte público. Os bombeiros foram acionados às 4h17 da madrugada deste domingo.
Durante a madrugada, os criminosos incendiaram as sedes da Prefeitura de Careiro Castanho, do Centro do Idoso e do Centro Digital do município – também localizado na Região Metropolitana de Manaus. Prédios públicos também foram depredados na cidade de Parintins, que fica distante 372 quilômetros em linha reta da capital do Amazonas.
De acordo com o secretário de Segurança, coronel Louismar de Matos Bonates, “o policiamento está sendo reforçado para que o direito de ir e vir da população não seja prejudicado” nas cidades. Cerca de 2.000 homens da Polícia Militar estão nas ruas das quatro cidades.
Bonates disse que o departamento de inteligência da SSP aponta que a ordem de depredação partiu de um presídio. “Os nomes dos mandantes também já estão sendo levantados e estes serão, posteriormente, transferidos para um presídio federal”, disse o secretário.
Na coletiva, o coronel Bonates classificou os ataques como “eventos críticos”, “brincadeira” e coisa “de vagabundinho que se reúnem, aproveitando o momento aí para fazer balburdia na cidade”.
A Amazônia Real apurou que os bairros atacados em Manaus sofrem com toque de recolher dos traficantes: Compensa, Planalto, Petrópolis, Santa Etelvina, São José 2, Novo Aleixo, Cidade de Deus, Japiim, Tarumã Açu, Jorge Teixeira, Armando Mendes e Flores.
Morte de traficante
A Secretária de Segurança Pública do Amazonas disse em coletiva à imprensa nesta manhã que os ataques foram uma resposta à morte de um dos líderes da facção Comando Vermelho identificado como “Dadinho”. Ele morreu em troca de tiros no sábado (05) com policiais militares da Rocam.
“Isso aí foi motivado em razão da morte de um traficante conhecido como ‘Dadinho’ e a inteligência levantou que essa ordem veio de dentro do presídio. Eu quero informar que quem for localizado dando essa ordem, será solicitada a transferência”, disse o secretário de Segurança Pública, coronel Louismar Bonates na coletiva à imprensa.
De acordo com o jornal A Crítica, “Dadinho” é Erick Batista Costa. Segundo a Polícia Militar, o confronto entre a Rocam e o traficante aconteceu por volta das 20h de sábado no bairro Novo Aleixo, na zona norte de Manaus. A polícia recebeu uma denúncia que o homem, de 30 anos de idade, e líder de uma facção criminosa, estaria portando uma arma de fogo.
“A equipe [se] deslocou ao local e conseguiu visualizar o suspeito com as características repassadas na denúncia. O suspeito ao perceber a presença da equipe Rocam, evadiu-se para o interior de uma estância empunhando uma arma de fogo. A equipe ao adentrar no local, foi recebida por disparos de arma de fogo. A equipe revidou a injusta agressão, vindo alvejar o infrator”, disse a PM.
A Polícia Militar informou que foi prestado socorro ao suspeito no Hospital e Pronto Socorro Platão Araújo. “O mesmo não resistiu aos ferimentos e veio a óbito. Diante dos fatos a equipe se deslocou a Delegacia Especializada em Homicídios e Sequestros para procedimentos de Polícia Judiciária”.
Com “Dadinho”, de acordo com a PM, foram apreendidas uma arma de fogo, tipo pistola, marca Taurus, modelo PT 840, calibre .40, numeração suprimida, com carregador de tombo 58221 contendo três munições intactas. “O infrator possuía passagens por tráfico de drogas, porte ilegal de arma de fogo e homicídio”.
Ainda, segundo o jornal A Crítica, a ordem dos ataques partiu do irmão de “Dadinho” identificado como “Ton”. Procurada, a SSP não informou de qual presídio partiu a ordem dos ataques nas cidades amazonenses.
Manaus já foi cenário de ataques e massacres
Não é a primeira vez que Manaus é atacada por traficantes. Em 2009, a zona centro-sul da cidade teve lojas depredadas, segundo a Polícia Civil, por ordem do deputado Wallace Souza e o traficante Moa, que lideravam uma organização criminosa que encomendava mortes para transmitir ao vivo no seu programa policial “Canal Livre” do político. A história macabra, que teve repercussão internacional, ganhou uma versão adaptada para a televisão na série “A Lei”, do canal pago Space.
Em 1º. de janeiro de 2017, a população de Manaus ficou sobressaltada com o massacre de 56 detentos, eles foram mortos carbonizados nas celas do Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj).
À época, o governo do Amazonas classificou como “massacre” a rebelião que durou mais de 17 horas e terminou com uma fuga em massa de mais de 100 presos. Os detentos morreram com requintes de crueldade e barbárie: decapitados, queimados e jogados do alto do Compaj, crimes que afrontam os direitos humanos. O presídio, considerado de segurança máxima, figura como um dos piores do sistema prisional brasileiro, segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
A agência Amazônia Real procurou a assessoria do governador Wilson Lima (PSC) para ele falar sobre os ataques da facção criminosa Comando Vermelho, mas ele ficou em silêncio. Na quarta-feira (2), ele foi alvo da operação Sangria da Polícia Federal, que investiga desvio de recursos públicos para o combate à pandemia da Covid-19 no Amazonas. Na ocasião, o secretário de Saúde do Amazonas, Marcellus Campelo, foi preso. A PF cumpriu mandado de busca e apreensão na casa e no gabinete do governador.