12/09/2011 16h39 – Atualizado em 15/09/2011 14h03
Ninguém que tenha cinqüenta anos ou mais e for sincero, seja de direita ou de esquerda, dirá que inexiste a possibilidade de a direita brasileira desfechar outro golpe de Estado. Poderia até ser um golpe “institucional” como o que houve recentemente em Honduras, que misturou elementos do golpismo latino-americano tradicional com um verniz “legal”, mas a direita latina foi, é e duvido de que um dia deixe de ser golpista por excelência.
Não é por outra razão que são quase sempre jovens os que vêm discordando com maior veemência da premissa de que esses movimentos moralistas que ganharam força no Brasil há alguns meses encerram excelente matéria-prima para o tradicional golpismo que flagelou este país durante todo o século XX. Não viveram a ditadura, não a viram funcionar. Não sabem do que a direita brasileira é capaz. Ouviram falar, leram, estudaram, mas não viram.
Quando o correspondente do periódico espanhol El País no Brasil, Juan Arias, provavelmente por encomenda da mídia tupiniquim e dos seus aliados políticos exortou os brasileiros a saírem às ruas “contra a corrupção” como vem acontecendo na Espanha e em vários outros países europeus, este blogueiro viu, ali, um sinal de alerta.
Por quê? Simples: o amplo espaço que a mídia brasileira deu àquele questionamento que o jornalista europeu fez, cobrando que a população brasileira (que vê seu país ir de vento em popa) agisse como os europeus (que vêem seus países mergulharem cada vez mais no caos econômico e social), já revelava que viria alguma coisa como o que de fato acabou vindo, com “os brasileiros” saindo às ruas “contra a corrupção”.
Mesmo quem não viu a ditadura militar em ação mas tem maior sensibilidade e clarividência certamente se lembra de que o comportamento da direita brasileira durante a crise do mensalão teve um viés claramente golpista. Isso quem diz não é o Eduardo Guimarães. O ex-presidente Lula disse e o cientista político Fábio Wanderley Reis, professor da UFMG, proferiu, certa vez, esta frase: “Se o cavalo do golpe passar selado, a direita monta”.
O tira-teima dessa questão está no comportamento da mídia durante a recente crise em Honduras, após o golpe de Estado que retirou o ex-presidente Manuel Zelaya da cama no meio da noite e o levou de pijamas ao aeroporto e o deportou. A mídia passou meses dizendo que era ele o golpista e que não teria havido golpe algum. Aí a prova do golpismo latente que povoa os devaneios de Frias, Mesquitas, Marinhos, Civitas e seus leões-de-chácara midiáticos.
Agora analisemos a conjuntura política. Após aquela conversa de Juan Arias sobre os brasileiros terem que ir à rua “contra a corrupção”, a mídia começa a bater na tecla, reproduzindo e comentando seu artigo sem parar e, do nada, surgem movimentos nessa direção. Movimentos insipientes, de início, mas que eram comemorados pela mídia a cada passo que davam.
A ampla publicidade que esses movimentos receberam da mídia, impressiona. Tudo ia ficando cada vez mais claro. Jornais, revistas, rádios, tevês, portais de internet e, sobretudo, os blogs que a direita midiática usa para fustigar o PT e Lula, incentivando adesão aos movimentos “contra corrupção”, dando informações sobre “como participar” etc.
Claro que o objetivo mais visível é o de jogar o governo Dilma contra os aliados, sobretudo contra o PMDB, de forma que este deixasse a base aliada, o que significaria a morte prematura desse governo. Mas, como disse o professor Fábio Wanderley Reis, ainda hoje, meio século após a eclosão da ditadura, se a oportunidade aparecer a direita abraça.
A juventude precisa entender que a direita midiática não quer democracia porque só quer no poder os partidos identificados com a sua ideologia e interesses. Por isso, há quase nove anos que a escandalização generalizada da política se tornou uma prática que só os cegos ou mal-intencionados não enxergam ou dizem não enxergar.
O governo Dilma vem contemporizando com essa direita, tirando-a, aos poucos, do estado de pé-de-guerra em que entrou durante a era Lula. Mas que Dilma não se engane: a direita midiática não se converteu aos cânones democráticos. Para acalmá-la, portanto, Dilma flerta com a rendição. Sem falar que, se a centro-esquerda perder o poder, sem regulação da mídia a direita não sairá do poder nunca mais estando o país fortalecido como está e com a mesma mídia apoiando.
Diante disso, quem tem idéia do que é a política no Brasil e na América Latina e não aceita esses estratagemas obscuros da direita midiática, não pode ficar parado vendo crescer um movimento moralista que, sob determinadas condições, pode se transformar no cavalo selado que a direita não hesitaria em montar se lhe passasse à porta.
Espanta-me que alguém não enxergue que um país em que chefes e clubes militares vivem exaltando a ditadura e fazendo ameaças jamais estará imune a novas aventuras golpistas. Jair Bolsonaro só pode fazer o que faz impunemente porque este país ainda é refém dos militares golpistas, muitos dos quais ainda não vestiram o pijama.
Aliás, esses que não acreditam no golpismo tupiniquim deveriam ir assistir jornalistas da grande mídia como Reinaldo Azevedo ou Merval Pereira se reunindo publicamente com militares golpistas defensores da ditadura quando todos eles, juntinhos, fazem ameaças veladas à democracia.
O ato público contra a corrupção da mídia golpista que o Movimento dos Sem Mídia programou para o dia 17 de setembro próximo, às 14 horas, no vão livre do Museu de Arte de São Paulo (Masp), portanto, constitui um antídoto e um elemento de dissuasão aos delírios golpistas que povoam as mentes embotadas dessa direita que manteve este país de joelhos por duas décadas. E que pode ter recaída a qualquer momento.
Sobre o autor
Alessandro Martins Prado
Mestre em Direito na área de concentração de Tutela Jurisdicional no Estado Democrático tendo a Dissertação de conclusão do curso aprovada com Distinção pelos membros da Banca Examinadora. Especialista em Direito Civil e Processual Civil.Coordenador do Curso de Pós-Graduação em Direitos Humanos da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul e docente efetivo do Curso de Direito da Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul – UEMS – Unidade de Paranaíba, ministrando aula nas disciplinas de Ética Geral e Jurídica e Direito Internacional Público e Privado. Líder de Grupo de Pesquisa de Direitos Humanos cadastrado no CNPq.
Colaboração: Alessandro Martins Prado