14/02/2014 14h38 – Atualizado em 14/02/2014 14h38
Por Paulo Nogueira
E então só se fala de Sininho, a ativista nascida no Rio Grande de Sul e radicada no Rio de Janeiro.
A Globo e a Veja estão massacrando Sininho, e isto leva a crer que a garota tem virtudes.
Sininho, 28 anos, cineasta, é essencialmente uma jovem inconformada com o “sistema”.
Que jovem idealista não estaria, diante das circunstâncias?
Você vê índios sendo mortos, operários se destruindo nas obras da Copa, brasileiros miseráveis sendo removidos de suas casas precárias por causa do Mundial – e vai ficar conformado, se tem sensibilidade social?
A cidade em que vive Sininho ajuda também a entender seu inconformismo: como aturar, sentado no sofá, o desgoverno de Cabral?
“Ah, não vamos para a rua porque Cabral é chapa do Lula”: quem diria isso?
E então os jovens vão às ruas e são recebidos pela polícia predadora de Cabral, sob a omissão de um governo federal que não podia mexer nos brios de seu aliado.
Ora, condenar Sininho é farisaico.
Ela representa o espírito do tempo. Seus pais, segundo ela, participaram da fundação do PT.
Mas para ela, e para muitos outros jovens da mesma geração, o PT acabou por se transformar no sistema.
Ou você quer que Sininho veja Lula abraçado a Maluf e Sarney ou Dilma comprometida com os ruralistas e se sinta representada?
Querer transformar os black blocs em terroristas é uma falácia, um gesto cínico e indefensável.
Que a direita faça isso, entende-se por seu apego a privilégios e medo de tudo que represente oposição a regalias ancestrais.
Mas o PT?
As acusações são bizarras. Eles são atacados porque são “mascarados”. E daí? Tentaram matar uma família num carro quando tudo que ocorreu foi que um motorista assustado tentou passar com seu Fusca baixo sobre um colchão em chamas.
Mataram o cinegrafista e conseguiram seu primeiro cadáver.
Ora, foi um acidente lastimável, triste, mas foi exatamente isto: um acidente. Ninguém pegou uma arma e atirou contra Santiago.
Coube a Sininho mesma trazer um pouco de lógica ao debate ao perguntar: por que a Band não deu um capacete para proteger seu cinegrafista? Em áreas conflagradas mundo afora, isso acontece: dar proteção aos jornalistas que cobrem protestos perigosos.
O DCM é visceralmente antiviolência. Somos franciscanos na essência. Andamos com passarinhos nos ombros, e ficamos maravilhados com o Papa Francisco, nosso ídolo. Gandhi e Luther King estão em nossos corações.
Agora: a violência nos protestos do Rio é obra da polícia. Em algum momento, os black blocs entraram em cena para proteger os manifestantes.
Eles são uma reação à truculência policial.
Não fosse a violência policial, altamente estimulada pela mídia com sua pregação contra os “vândalos” e “baderneiros”, eles provavelmente nem tivessem surgido no Brasil.
Agora mesmo: a direção da empresa jornalística alemã Deutsche Welle manifestou formalmente à embaixada brasileira na Alemanha seu protesto contra as cacetadas que seu correspondente levou no protesto em que morreu Santiago. Ninguém prestou atenção nisso, exceto, modéstia à parte, o DCM. O relato do correspondente conta tudo: uma manifestação pacífica virou um campo de guerra por causa da polícia.
Repito: por causa da polícia.
E em vez de dar um basta à violência policial, os crucificados são os black blocs, por pura conveniência e oportunismo político.
Vamos encarar os fatos: o PT detesta os black blocs por dois motivos. Um: eles não obedecem ao partido. Sequer respeitam. Dois: os protestos podem por em risco, na visão petista, a eleição fácil de Dilma.
O segundo item é uma fantasia. Dilma, com ou sem black blocs, caminha para uma reeleição fácil, dada a fragilidade excepcional da oposição.
Não surgiu, com envergadura, partido nenhum que represente uma nova ordem social menos injusta. É uma tremenda sorte para o PT — e um enorme azar para o país — que do lado de lá estejam fósseis políticos como Aécio, Serra, FHC, Marina, Eduardo Campos etc. Um partido envelhecido como o PT parece jovem diante de rivais encarquilhados.
A não ser que o PT se reinvente, o que parece difícil, no futuro o espaço estará aberto a um partido que realmente interprete a raiva das ruas contra tantos absurdos.
A mensagem de Sininho, no fundo, é esta: o Brasil tem que ser melhor do que é.
Como discordar?
O jornalista Paulo Nogueira é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.