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segunda-feira, 25 de novembro de 2024

Ucrânia: golpe ou revolução?

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25/02/2014 13h40 – Atualizado em 25/02/2014 13h40

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A queda do governo Yanukovych é só a primeira fase de uma atribulada transição na Ucrânia

Por José Antonio Lima – Carta Capital

Afastado Viktor Yanukovych da presidência da Ucrânia, há uma disputa em curso a respeito da natureza do movimento político que produziu sua saída. Alguns veículos da imprensa ocidental, como as revistas Time e The New Republic, adotaram o termo “revolução”, enquanto o próprio Yanukovych e seus patronos russos falam em “golpe”. A rigor, a queda do presidente ucraniano se aproxima mais a um golpe, mas isso não significa que o desfecho não pode ser positivo.

Quando se trata dos termos “revolução” e “golpe”, a conotação das palavras conta mais que seu sentido denotativo. Revolução tem um forte sentido positivo, pois geralmente elas são realizadas contra regimes autoritários e, portanto, indicariam o caminho do “bem”, da democracia. Os golpes, ao contrário, têm sentido negativo, pois trazem à mente rompimentos da ordem democrática, geralmente provocados por militares com o apoio de setores civis.

Toda essa conotação, entretanto, é motivada politicamente. Há exemplos tanto de revoluções negativas quanto de golpes positivos. A Revolução Russa, por exemplo, derrubou o cruel czarismo, mas implantou o comunismo autoritário; a Revolução Iraniana derrubou a terrível ditadura do xá Reza Pahlevi, mas em seu lugar deixou um regime híbrido de teocracia e democracia controlada.

Do lado do “golpismo” também há exceções. A hoje chamada Revolução dos Cravos de Portugal, que deu origem ao atual período democrático português, foi iniciada, na realidade, com um golpe militar contra o autoritarismo do Estado Novo que vigorava então. No Egito, o golpe palaciano dos militares contra Hosni Mubarak abriu espaço para a democracia que elegeu Mohamed Morsi (apesar de tal período ter sido interrompido no ano passado com outro golpe).

Revolução e golpe são termos intrínsecos à política e, sendo assim, é praticamente impossível evitar a politização de ambos. Para entender os eventos, entretanto, é preciso recorrer a um mínimo de rigor acadêmico.

H.M. Hyndman e outros autores definem revolução como uma mudança completa na ordem social, um movimento que traz impactos não só políticos como econômicos e religiosos, exatamente como nas revoluções russa e iraniana. O golpe é mais fácil de identificar. Pela definição Charles Sampford, o golpe ocorre “quando os militares ou uma parte das Forças Armadas volta seu poder coercitivo contra o cume do Estado, se estabelece lá, e o resto do Estado recebe ordens do novo regime”. Cabe nesta definição, por exemplo, o golpe de 1964 no Brasil contra João Goulart.

O que ocorreu com Yanukovych na Ucrânia, assim, não é nem de longe uma revolução, mas também não chega a ser um golpe completo.

Seu caso é mais parecido com o golpe que derrubou Manuel Zelaya em Honduras, em 2009. Naquela oportunidade, os militares tinham interesse em se ver livres do então presidente e intervieram de forma pontual, tirando Zelaya do poder e enviando-o (de pijamas) para a Costa Rica. Nos momentos seguintes, entregaram o comando da situação aos civis.

No caso ucraniano, os militares intervieram ao não intervir. Ao garantirem neutralidade, abriram o caminho para a saída de Yanukovych que, por conta da intransigência e da extrema brutalidade empregada contra os manifestantes, havia virado o alvo primordial dos protestos, a ponto de ser abandonado por seus correligionários do Partido das Regiões. Com a certeza de que as Forças Armadas não se mexeriam, manifestantes tomaram prédios do governo e a residência oficial em Kiev. Nas horas seguintes, o Congresso convenientemente aprovou o impeachment de Yanukovich, legalizando o “quase golpe”.

A transição para um novo governo, que deve ser eleito em 25 de maio, não servirá, entretanto, para colocar fim à crise na Ucrânia. O país, dividido entre a Europa e a Rússia, vive uma crise de identidade que exige soluções de longo prazo. Enquanto as regiões oeste e norte, onde predominam a etnia e a língua ucranianas, desejam se aproximar da União Europeia, o leste e o sul do país buscam aliança com a Rússia, com a qual têm mais afinidade. Diante da derrubada de Yanukovych, que deu início à crise ao recusar, sob pressão de Moscou, um acordo comercial com a União Europeia, há crescente insatisfação na região leste da Ucrânia e, na Crimea, província ao Sul, cresce o sentimento de separatismo. Mais que um golpe ou uma revolução, a Ucrânia precisa de um estadista corajoso e disposto a manter a integridade da nação, o que certamente exigirá concessões de lado a lado e, talvez, o rompimento da integridade territorial da Ucrânia atual. Não será nada fácil.

José Antonio Lima, Jornalista, mestrando em Relações Internacionais. É editor do site de CartaCapital desde abril de 2012. Escreve sobre mundo, política e esportes.

Viktor Yanukovych, o presidente deposto da Ucrânia, durante reunião em Kiev em 21 de fevereiro. Atrás dele, o ministro do Exterior da Alemanha, Frank-Walter Steinmeier

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